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sábado, 2 de julho de 2011

"O Pequeno Príncipe", Antoine de Saint-Exupéry

Escrito pelo francês Antoine de Saint-Exupéry e publicado em 1943, "Le Petit Prince" é uma das obras clássicas mais belas e tocantes da literatura mundial. Apesar de ser escrito para crianças, tem a intenção de atingir as pessoas grandes. Posso afirmar, inclusive, que sou parte da manifestação desta múltipla interpretação que o livro oferece, pois o li na infância e, recentemente, o reli, criando, a cada leitura, uma perspectiva diferente das cenas e acontecimentos. Um livro multifacetado, que apresenta uma interpretação embasada no que está escrito na alma de seu leitor. 
Mas como poderia o autor previamente conhecer o interior de seu público de milhares, de todas as épocas posteriores a ele, de todos os pensamentos? É exatamente esta a mágica da obra, é por isso que ela encanta pessoas do mundo inteiro, de todas as idades: "O Pequeno Príncipe" parece ter sido escrito para cada um de nós.
Logo no início, nos é apresentada uma metáfora: um desenho que pode parecer um chapéu e, no entanto, é uma jibóia que engoliu um elefante. Só aqueles que não perderam ainda sua alma infantil podem decifrar o enigma do que, de fato, representa o desenho. Da mesma maneira, só aqueles que ainda são capazes de possuir sentimentos puros, verdadeiros são capazes de compreender as inúmeras lições do pequeno príncipe, refletir sobre suas ações de acordo com as palavras dele e guardar tudo isto no coração.
Postarei algumas passagens do livro que achei de grande interesse interpretativo. Não farei sua interpretação para que os leitores busquem perceber o que está escrito nas entrelinhas.
A história se inicia com seu narrador, que cai em pleno deserto do Saara com seu avião. E, após dias tentando consertá-lo sem sucesso, encontra o pequeno príncipe. Não se sabe como uma criança como aquela pode parar em pleno deserto do Saara, mas quando o príncipe começa a contar sua história, começamos a compreender. Ele vinha de um asteróide pequeno, B612, onde vivia com uma flor. A flor era arrogante e orgulhosa e, no entanto, o principezinho a amava. Todos os dias ele tirava as larvas de sua flor, mas deixava vivas duas ou três.
"É preciso que eu suporte duas ou três larvas se quiser conhecer as borboletas."
Em seu planeta, ele tinha problemas com raízes de baobás, que ele tinha de retirar todos os dias. Por isso, precisava de um carneiro que comesse esses baobás.
"Fiz notar ao principezinho que os baobás não são arbustos, mas árvores grandes como igrejas. E que mesmo que ele levasse consigo todo um rebanho de elefantes, eles não chegariam a dar cabo de um único baobá.
[...] 
Mas notou, em seguida, sabiamente:
- Os baobás, antes de crescer, são pequenos."
Antes de chegar à terra, o principezinho havia passado por vários outros planetas, onde encontrou pessoas as mais diversas.
O primeiro deles foi o Rei, que vivia em um asteróide muito pequeno e pensava governar sobre o Sol e as estrelas. Para ele, todos eram súditos, pois assim é para os reis. No entanto, ele possuía razões coerentes para acreditar que tudo que ele ordenava era cumprido.
"É preciso exigir de cada um o que cada um pode dar, replicou o rei. A autoridade repousa sobre a razão. Se ordenares a teu povo que se lance ao mar, farão todos uma revolução. Eu tenho o direito de exigir obediência porque minhas ordens são razoáveis."  
E entre essas ordens razoáveis estava, por exemplo: "Que o Sol repouse durante o pôr-doSol".
O rei queria que o principezinho ficasse em seu planeta, tornando-o juiz. No entanto, o planeta, à excessão da presença do rei, era deserto.
 "- Tu julgarás a ti mesmo, respondeu o rei. É o mais difícil . É bem mais difícil julgar a si mesmo que julgar aos outros. Se consegues julgar-te bem, eis um verdadeiro sábio."
No segundo planeta que visitou, o pequeno princípe encontrou um vaidoso, que achava que todos eram admiradores, pois assim é para os vaidosos. Sua alegria se dava em aplausos e elogios. A única coisa que ele almejava era ser admirado.
No terceiro planeta, o principezinho conheceu um bêbado que bebia por vergonha... de beber. E aqui a obra não trata somente da bebida, mas da incoerência humana.
No quarto planeta, conheceu um homem de negócios que vivia a contar as estrelas, pois pensava que as possuía. Mas qual a utilidade de possuir coisas somente para contá-las. O principezinho lhe disse:
"Eu, disse ele ainda, possuo uma flor que rego todos os dias. Possuo três vulcões que revolvo toda semana. Porque revolvo também o que está extinto. A gente nunca sabe. É últil para meus vulcões, é útil para minha flor que eu os possua. Mas tu não és útil às estrelas..."
No penúltimo planeta, conheceu um iluminador de lampadas. O primeiro personagem que realmente possuía um trabalho útil. No entanto, seu planeta girava cada vez mais rápido e cada vez mais rápido ele precisava acender e apagar as lâmpadas. Havia um tempo em que este serviço era realmente coerente, visto que o tempo entre o amanhecer e anoitecer era longo. Neste tempo, foi criado um regulamento que o iluminador seguia até então. Ele representa o conservadorismo e a alienação. É, em sua simplicidade, um dos personagens mais representativos do livro.
Por fim, ele visita o planeta de um geógrafo que não conhece seu próprio planeta, pois "um geógrafo é  muito importante para estar passeando". Por isso, ele precisa de exploradores, que não existem em seu planeta. Ele representa as pessoas que precisam da narração de outras para conhecer as coisas, enquanto que para o principezinho é necessário esforço para conhecer as coisas.
Já na terra, o príncipe conhece uma raposa e então se dá o diálogo mais belo e conhecido do livro.
"-Os homens,disse a raposa,têm fuzis e caçam. É bem incômodo! Criam galinhas também. É a única coisa interessante que eles fazem. Tu procuras galinhas?
-Não,disse o principezinho. Eu procuro amigos. Que quer dizer "cativar"?
- É uma coisa muito esquecida,disse a raposa.Significa "criar laços...".
-Criar laços?
-Exatamente, disse a raposa. Tu não és ainda para mim senão um garoto inteiramente igual a cem mil outros garotos. E eu não tenho necessidade de ti. E tu não tens necessidade de mim. Não passo a teus olhos de uma raposa igual a cem mil outras raposas. Mas se tu me cativas, nós teremos necessidade um do outro. Serás para mim único no mundo. E eu serei para ti única no mundo...
-Começo a compreender,disse o principezinho...Existe uma flor...eu creio que ela me cativou...
[...]
- Minha vida é monótona. Eu caço as galinhas e os homens me caçam. Todas as galinhas se parecem e todos os homens se parecem também. E por isso eu me aborreço um pouco. Mas se tu me cativas, minha vida será como que cheia de sol. Conhecerei um barulho de passos que será diferente dos outros. Os outros passos me fazem entrar debaixo da terra. O teu me chamará para fora da toca, como se fosse música. E depois, olha! Vês, lá longe, os campos de trigo? Eu não como pão. O trigo para mim é inútil. Os campos de trigo não me lembram coisa nenhuma. E isso é triste! Mas tu tens cabelo cor de ouro. Então será maravilhoso quando me tiveres cativado. O trigo, que é dourado, fará lembrar-me de ti. E eu amarei o barulho do vento no trigo...
A raposa calou-se e considerou por muito tempo o príncipe:
- Por favor... cativa-me! disse ela.
- Bem quisera, disse o principezinho, mas eu não tenho muito tempo. Tenho amigos a descobrir e muitas coisas a conhecer.
- A gente só conhece bem as coisas que cativou, disse a raposa. Os homens não têm mais tempo de conhecer coisa nenhuma. Compram tudo prontinho nas lojas. Mas como não existem lojas de amigos, os homens não têm mais amigos. Se tu queres um amigo, cativa-me!
- Que é preciso fazer? perguntou o principezinho.
- É preciso ser paciente, respondeu a raposa. Tu te sentarás primeiro um pouco longe de mim, assim, na relva. Eu te olharei com o canto do olho e tu não dirás nada. A linguagem é uma fonte de mal-entendidos. Mas, cada dia, te sentarás mais perto...
No dia seguinte o principezinho voltou.
- Teria sido melhor voltares à mesma hora, disse a raposa. Se tu vens, por exemplo, às quatro da tarde, desde às três eu começarei a ser feliz. Quanto mais a hora for chegando, mais eu me sentirei feliz. Às quatro horas, então, estaria inquieta e agitada: descobrirei o preço da felicidade! Mas se tu vens a qualquer momento, nunca saberei a hora de preparar o coração... É preciso ritos.- Que é um rito? perguntou o principezinho.- É uma coisa muito esquecida também, disse a raposa. É o que faz com que um dia seja diferente dos outros dias; uma hora, das outras horas. 
[...]Assim, o principezinho cativou a raposa. Mas, quando chegou a hora da partida, a raposa disse:
- Ah! Eu vou chorar.
- A culpa é tua, disse o principezinho, eu não te queria fazer mal; mas tu quiseste que eu te cativasse...
- Quis, disse a raposa.
- Mas tu vais chorar! disse o principezinho.
- Vou, disse a raposa.
- Então, não sais lucrando nada.
- Eu lucro, disse a raposa, por causa da cor do trigo. 
[...] E voltou, então, à raposa:
- Adeus, disse ele...
- Adeus, disse a raposa. Eis o meu segredo. É muito simples: só se vê bem com o coração. O essencial é invisível para os olhos.
- O essencial é invisível para os olhos, repetiu o principezinho, a fim de se lembrar.
- Foi o tempo que perdeste com tua rosa que fez tua rosa tão importante.
- Foi o tempo que eu perdi com a minha rosa... repetiu o principezinho, a fim de se lembrar.
- Os homens esqueceram essa verdade, disse a raposa. Mas tu não a deves esquecer. Tu te tornas eternamente responsável por aquilo que cativas. Tu és responsável pela rosa... "
Após este diálogo, não há condições de tecer comentários.
Ao final, para retornar a seu planeta, o príncipe pede a uma cobra que o morda. Ao aviador, ele parece estar morrendo. O príncipe, antes se explica:
"Tu compreendes. É longe demais. Eu não posso carregar esse corpo. É muito pesado."
Deste trecho, podemos também retirar um leque de interpretações, inclusive espirituais e religiosas, as quais deixarei para os leitores.
O enigma final sobre a morte do pequeno príncipe nos faz refletir: dependendo de nossa capacidade de ver o lado bom das coisas e imaginar, consideramos o principezinho morto ou não. É a velha história de ver o copo meio cheio ou meio vazio. Quando desconhecemos o fim da história, cabe ao nosso otimismo fazer o fim feliz ou triste.
Temo que meus comentários sejam parcos e pobres diante da vastidão de interpretações e lições que a obra fornece. Se há um conselho, porém, que posso lhes dar; se há um livro, dentre todos, que merece ser lido e gravado no coração, "O Pequeno Príncipe" é este.

Obs.: Na maior parte das edições do livro e nesta postagem, as aquarelas são do autor.

Video-curiosidades:

Em 1974, foi lançado o musical "The Little Prince".
Na década de 80, uma série chamada "As aventuras do pequeno príncipe" surgiu na TV.
Uma nova série de desenhos animados já foi lançado e está fazendo sucesso em outros países.
São diversas as adaptações deste livro e a escolha destas três para citar foi aleatória, visto que eu não tive contato com nenhuma delas. No entanto, o livro é insuperável.